É indiscutível que ter um carro elétrico oferece inúmeras vantagens, como menor custo de operação e emissões zero, mas a recarga da bateria ainda é um desafio, especialmente por conta da infraestrutura de carregamento e devido ao tempo de recarga. Em média, no Brasil, carregar um carro elétrico pode levar de 4 a 10 horas com carregadores residenciais de parede (wallbox) e mais de 24 horas em uma tomada comum. Mesmo nas estações públicas de recarga rápida, que oferecem corrente contínua (DC), o tempo médio ainda gira em torno de 40 minutos a 1 hora para atingir 80% da bateria – isso em condições ideais. Em climas frios, esse tempo pode aumentar significativamente, e a autonomia também tende a cair.
Nos Estados Unidos, esse cenário tem desestimulado potenciais compradores. Dados recentes da AAA (a Associação Automobilística Americana) mostram que o número de americanos interessados em adquirir um carro elétrico caiu de 23% para 18% entre 2023 e 2024, com o inverno rigoroso sendo apontado como um dos principais vilões: carregamentos mais lentos e desempenho comprometido afastam motoristas, sobretudo em regiões de clima severo.
A boa notícia vem da Universidade de Michigan onde engenheiros afirmam ter encontrado uma solução promissora. Eles desenvolveram um novo processo de fabricação de baterias que permite carregamentos até 500% mais rápidos em temperaturas de até -10 °C, sem comprometer a densidade energética ou a vida útil das células. “Queremos resolver justamente o ponto mais crítico: o tempo de carregamento em clima frio”, afirma Neil Dasgupta, professor de engenharia mecânica e ciência dos materiais, que lidera o estudo publicado na revista científica Joule. “Pela primeira vez, mostramos que é possível unir carregamento extremamente rápido a baixas temperaturas com alto desempenho energético.”
A inovação combina duas tecnologias. A primeira é a adição de canais microscópicos no ânodo — eletrodo responsável por armazenar os íons de lítio durante o carregamento. Criados com jatos de laser, esses canais facilitam o fluxo dos íons mesmo nas camadas mais profundas da bateria. A segunda é um revestimento vítreo ultrafino, feito de borato-carbonato de lítio, que estabiliza a superfície do eletrodo e evita a formação de depósitos metálicos, um fenômeno comum em baixas temperaturas que degrada a performance da bateria.
O resultado: baterias que mantêm 97% da capacidade após 100 ciclos de carga rápida no frio, com tempo de carregamento até cinco vezes menor do que o das baterias tradicionais. “Mesmo em carregadores rápidos, o tempo de espera no frio ultrapassa uma hora. Isso afasta o consumidor”, diz Dasgupta. A tecnologia já está em processo de comercialização por meio da startup Arbor Battery Innovations, vinculada à universidade. A expectativa é que o avanço possa ser integrado à cadeia produtiva sem grandes mudanças nas linhas de montagem atuais — fator crucial para sua adoção em escala.
O projeto recebeu apoio do Michigan Economic Development Corporation, por meio do hub de inovação MTRAC. As baterias foram desenvolvidas no Laboratório de Baterias da UM e analisadas no Centro de Caracterização de Materiais de Michigan. A universidade e o professor Dasgupta têm participação financeira na empresa que vai licenciar a tecnologia.