A criação disciplinada que recebi foi determinante para minha formação pessoal e profissional. Cresci em um lar simples, marcado por muito trabalho e repleto de bons valores, onde havia estabelecida uma rotina organizada, na qual cada um tinha responsabilidades e horários a cumprir. Além disso, desde cedo, meus pais me incentivaram a ajudar no comércio familiar. A somatória dessas ações desenvolveu em mim uma forte autonomia e contribuiu para desenvolver os sensos de responsabilidade e independência que até hoje me acompanham.
Sou natural de Porto Ferreira, interior de São Paulo, onde cursei todo o ensino fundamental em uma escola da rede pública. No ensino médio, minha mãe, que é professora, dobrou sua carga horária e passou a trabalhar em uma escola particular para que eu pudesse obter uma bolsa de estudos, garantindo acesso a uma educação de qualidade. Desde criança, demonstrava facilidade com números, uma aptidão que foi determinante para minha escolha de carreira, embora a decisão final tenha seguido um caminho curioso. Inicialmente, considerava ingressar em Engenharia e cheguei a optar pela Matemática ao me inscrever no vestibular da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Rio Claro (SP). Contudo, após uma conversa com meu pai, que me mostrou um artigo destacando a computação como área promissora, decidi mudar a rota. Felizmente, fui aprovado no curso de Ciências da Computação na mesma instituição e, em 2007, aos 17 anos, me mudei para outra cidade para cursar a faculdade, honrando assim o esforço dos meus pais na minha educação.
Estar longe da família e enfrentar pela primeira vez a independência me trouxe sentimentos de solidão e receio. O início foi especialmente complicado, mas gradualmente me adaptei ao ambiente universitário, encontrando na empresa júnior o primeiro estágio. Participar dessa organização estudantil foi algo transformador. Atuava em pequenos projetos de TI e também colaborava nos setores financeiro e jurídico. A vivência nas áreas de contabilidade e gestão me tornou um profissional mais completo e preparado para lidar com diferentes questões do mercado.
Busque por independência e realização profissional
Três anos depois, em 2010, antecipei matérias para concluir a graduação mais rapidamente. Sentia urgência em me preparar para o universo corporativo e passei a me candidatar a diversas vagas de emprego na região de Rio Claro, oferecendo meu trabalho até mesmo de forma voluntária. O objetivo principal era adquirir prática e cumprir as exigências com relação a carga horária de estágio obrigatório, independentemente de remuneração.
Felizmente, nesse contexto, ingressei em um estágio remunerado na Supersoft Sistemas, onde atuei como programador durante aproximadamente seis meses. Dessa forma, consegui finalizar o curso superior, com duração de quatro anos, em três anos e meio, obtendo o diploma aos 20 anos.
Recém-formado, comecei a enviar currículos. E logo fui chamado para uma entrevista na CI&T, em Campinas (SP), onde fui contratado como engenheiro de software júnior. Lembro-me da sensação ao entrar em um ambiente corporativo daquele porte, com equipes estruturadas e profissionais trabalhando intensamente. Naquele instante, senti que meu sonho de ingressar no mercado de tecnologia havia, enfim, se concretizado.
Aproveite suas habilidades e use a flexibilidade a seu favor
A trajetória na CI&T foi marcada por constantes mudanças. Após alguns meses, fui transferido para outro projeto, sendo designado para trabalhar com web design e ferramentas como Photoshop, algo totalmente novo para mim, que até então havia atuado exclusivamente em programação. Aceitei a proposta e aprendi muito. Essa flexibilidade tornou-se uma característica recorrente, possibilitando que eu desenvolvesse habilidades em áreas diversas.
Deixei a CI&T em 2012, quando entrei no Von Braun Labs. A empresa estava formando uma nova equipe de desenvolvimento de software em parceria com a Microsoft, o que me atraiu como uma oportunidade única. Nesta época tive acesso às versões iniciais do Windows 8 e participei da criação de aplicativos pioneiros para a plataforma. Este fato despertou o interesse em lançar produtos próprios, levando-me a desenvolver apps fora do horário de trabalho, os quais, juntos, acumularam mais de 5 milhões de downloads.
Em 2014, fui convidado para retornar à CI&T, onde assumi inicialmente uma posição de liderança técnica. Pouco tempo depois fui promovido a arquiteto de software, liderando equipes e aprofundando a atuação em projetos complexos. No ano seguinte, migrei para um projeto internacional, onde trabalhei diretamente com clientes dos Estados Unidos. Essa experiência aprimorou meu inglês e despertou-me o interesse em buscar oportunidades no exterior.
Construa sua carreira global com visão estratégica
A possibilidade de trabalhar em outro País surgiu em 2016, quando a empresa anunciou internamente uma vaga para Tóquio. Inicialmente, hesitei em me candidatar, pois o principal requisito era fluência em japonês, algo que não possuía. Contudo, graças ao incentivo dos colegas, decidi arriscar. Felizmente, o critério foi alterado, priorizando o inglês, e fui selecionado junto com outros 9 profissionais para iniciar o escritório da CI&T no Japão.
Enfrentar uma cultura e um idioma completamente diferente exigiu adaptação e resiliência. O ambiente corporativo tinha características de startup, com equipes enxutas e responsabilidades que iam além do desenvolvimento de software. Mas, todo o esforço valeu a pena. Durante esse período fui promovido a arquiteto de sistemas, liderando equipes no Japão e na China, elevando assim a visão global.
Considero a CI&T uma verdadeira escola, onde adquiri a maioria dos aprendizados que utilizo até hoje. Tive a sorte de trabalhar ao lado de gestores excepcionais, e ter contato com mentores impactantes. A visão de César Gon, CEO da CI&T, por exemplo, foi decisiva para moldar a cultura da empresa, criando um ambiente baseado em liderança autêntica e inspiradora. Ele é, sem dúvida, uma figura visionária que influenciou diretamente os líderes da empresa, deixando sua marca em cada aspecto da cultura da CI&T. Ele construiu uma liderança que equilibra inovação, empatia e excelência. E esses atributos continuam sendo alicerces para as decisões que tomo diariamente.
Em 2021, buscando novas demandas, comecei a prestar consultoria técnica para a MTI, empresa japonesa localizada em Tóquio, com filial no Vietnã. A consultoria resultou em uma proposta para assumir o cargo de CTO. Aceitei o convite e, pouco tempo depois, em 2023, fui promovido a executivo de tecnologia na sede no Japão, enquanto continuava liderando a equipe no Vietnã. Hoje, gerencio o departamento de Arquitetura de Sistemas no Japão e mantenho a atuação como CTO e vice-presidente na filial vietnamita. Após 8 anos vivendo e trabalhando no Japão, acumulei uma experiência valiosa em um país que segue transmitindo valores transformadores e me ensinando a lidar cada vez melhor com ambientes multiculturais.
Coerência e integridade constroem uma carreira autêntica
Há algum tempo, recebi um ensinamento valioso que aplico desde então: agir de forma coerente com os próprios valores. Recordo de uma frase marcante que diz: “Não ergas alto um edifício sem fortes alicerces. Se o fizeres, viverás com medo.” Essa lição reforça a importância de construir uma carreira consistente, embasada em princípios autênticos, e de evitar decisões motivadas por interesses que não estejam alinhados às crenças pessoais.
A estada no Japão me mostrou como a coerência é uma qualidade rara e valiosa. Em um ambiente onde muitos ajustam suas opiniões conforme as circunstâncias, manter a integridade é um diferencial. Essa congruência é a base de uma liderança que gera confiança e resultados sustentáveis em todos os âmbitos.
Empatia e liberdade inspiram equipes de alto desempenho
Promover a motivação e criar um ambiente de trabalho positivo e engajado é uma tarefa que exige dedicação diária. A experiência de viver fora do País ampliou a perspectiva da empatia nesse processo. No Japão, como estrangeiro e parte de uma minoria, enfrentei situações que constantemente me exigiram ir além para demonstrar minha capacidade. Essas vivências me ajudaram a perceber o quanto é necessário se colocar no lugar do outro para compreender desafios que nem sempre vivenciamos diretamente.
Como líder, acredito que a primeira etapa para motivar uma equipe é conhecer profundamente os integrantes e entender suas preocupações, objetivos e inspirações. Essa capacidade em enxergar o contexto sob a ótica do outro permite identificar o que realmente os move. Por isso, procuro manter um contato próximo, promovendo reuniões frequentes e estando sempre disposto a ouvir atentamente.
Meu estilo de liderança é fundamentado na concessão de autonomia, inspirado pela liberdade e responsabilidade que meus pais me ensinaram na juventude. Trabalhando com pessoas de diferentes culturas e experiências, não faria sentido ditar exatamente como cada um deve agir. Em vez disso, incentivo o aprendizado por meio de tentativas e erros, de modo que as falhas sejam vistas como oportunidades de crescimento. Adotar uma postura punitiva faria com que os colaboradores acabassem evitando riscos, temendo represálias, e isso seria muito negativo para o time. Portanto, essa abordagem leve não apenas fomenta a confiança, mas também estimula a inovação, essencial para o sucesso em qualquer contexto. Esses princípios criam uma atmosfera onde cada integrante se sente valorizado, motivado e capacitado para contribuir com o melhor de suas competências.
Evite atalhos e aja com coerência: esta é a chave do desenvolvimento
Para os brasileiros que desejam construir uma jornada no exterior, algumas características são fundamentais. A primeira delas é a responsabilidade, compreender o alcance de suas atribuições, conhecer as expectativas relacionadas ao papel que ocupa e desempenhá-las firmemente. Enfrente a pressão e supere os obstáculos iniciais, porque mudar para outro País não é uma tarefa simples. Trata-se de resistir às adversidades que surgem nos primeiros meses, como diferenças culturais, adaptação e solidão.
Além disso, é imprescindível preparar-se adequadamente, adquirindo vivências que lhe capacitem para projetos internacionais e que te permitam desenvolver pontos necessários, como a fluência em inglês. Neste processo esteja atento às armadilhas que podem ocorrer a qualquer momento. A zona de conforto é uma delas. Muitas pessoas preferem se limitar a um projeto ou uma função específica, evitando desafios que poderiam impulsioná-las. Para quem deseja evolução, fica a dica: aceite mudanças e tenha a mentalidade aberta sobre esse tema.
Destaco, por fim, o cuidado com o viés político. Já presenciei líderes que desenham suas opiniões e decisões exclusivamente para atender às conveniências do momento. Mas isso, geralmente, restringe o crescimento. Profissionais que agem de forma coerente com suas crenças, têm mais chances de alcançar posições executivas de destaque, pois transmitem autenticidade, credibilidade e sustentam, sem dúvida, uma carreira bem-sucedida, tanto no Brasil quanto no exterior.
Abrace desafios e mantenha uma visão proativa
Construir uma carreira de sucesso exige mais do que conhecimento profissional, requer também organização pessoal, incluindo o planejamento financeiro. Para quem está iniciando, um conselho: planeje uma base financeira. Mais importante do que focar apenas em aumentar os ganhos, é entender a relação entre receitas e despesas. Se o padrão for ganhar mais, será difícil alcançar uma estabilidade se gastar proporcionalmente. Por isso, é oportuno registrar detalhadamente rendimentos e gastos, revisando-os periodicamente para identificar o que é realmente necessário.
Mantenha o equilíbrio. Reserve uma parte da renda para momentos de diversão e descanso. E uma outra parte, a propósito, direcione para investimentos que possam gerar retornos no médio e longo prazo. O planejamento financeiro é o suporte para um futuro mais tranquilo.
E no caminho corporativo, assumir uma postura proativa é necessário para quem deseja crescer. Explorar diferentes áreas e se interessar por temas que, muitas vezes, não estão diretamente relacionados à sua atuação, amplia horizontes e agrega aprendizado. Foi essa mentalidade que me permitiu evoluir e assumir posições de destaque. Os momentos que trazem inquietação e forçam a lidar com o desconhecido são os que oferecem maior aprendizado. Agarre os desafios! Veja em cada um deles a oportunidade de evolução e mantenha uma visão otimista. Crescimento profissional e pessoal permanecem de mãos dadas, e enfrentar o novo com coragem é uma garantia para alcançar o sucesso merecido.
Livro recomendado por Geovanne Bertonha:
The Lean Startup, de Eric Ries. Editora Crown Currency, 2011.