Um pedaço de frango com 7 centímetros de largura e 2 centímetros de espessura acaba de entrar para a história da alimentação – não por sua crocância ou tempero, mas por ter sido inteiramente cultivado em laboratório. A façanha foi alcançada por pesquisadores no Japão, que suspenderam células de frango em gel e as transformaram, com auxílio de um dispositivo especializado, em tecido comestível. Sem penas, sem abate, sem granja.
O professor David Lobell, da Escola de Sustentabilidade Stanford Doerr e diretor do Centro de Segurança Alimentar e Meio Ambiente da instituição vê potencial na façanha, mas também muitos desafios no horizonte dos alimentos cultivados. Ele afirma que é natural que o público encare com desconfiança esse tipo de inovação. “É como a ideia de dirigir um carro autônomo. Com o tempo, as pessoas podem se acostumar — se o histórico for positivo”, diz. Mas o custo elevado das carnes cultivadas ainda é um dos grandes obstáculos para a popularização. “Elas sempre serão caras demais para muitas pessoas”, afirma.
O sabor, outro ponto sensível, também não tem convencido completamente. “Historicamente, o sabor costuma ser decepcionante. Às vezes, extremamente decepcionante”, comenta. Mesmo assim, Lobell reconhece avanços: produtos mais recentes têm surpreendido e podem indicar um caminho de superação, como já aconteceu com outras tecnologias que decepcionaram no início e surpreenderam depois.
Sustentabilidade?
Os impactos ambientais da produção convencional de carne são conhecidos – e variados. A carne bovina, por exemplo, é altamente emissora de gases de efeito estufa; a suína tem forte impacto na poluição da água. O frango, por sua vez, tende a ser o menos prejudicial. “Se a carne cultivada focar no frango, o impacto ambiental pode ser menor”, explica Lobell. Ele também destaca benefícios potenciais relacionados ao bem-estar animal e à redução do risco de doenças.
Ainda assim, ele é cético quanto à velocidade com que as carnes de laboratório poderão influenciar a sustentabilidade de forma significativa. “Minha resposta curta é que provavelmente não será tão cedo a ponto de realmente importar — pelo menos para a carne cultivada”, afirma. No entanto, ele vê potencial em alternativas como gorduras cultivadas de porco ou peixe, que podem ser misturadas a produtos vegetais, e em métodos como a fermentação, que podem se mostrar mais escaláveis e eficazes.
Misturar pode ser a saída
Uma das tendências mais promissoras, na visão de Lobell, são os produtos híbridos, que combinam proteínas tradicionais e alternativas. Hambúrgueres ou nuggets com parte da carne substituída por ingredientes cultivados ou vegetais podem oferecer uma solução de transição. “Essa pode ser uma maneira mais rápida de escalar do que depender apenas de produtos totalmente não animais”, conclui.