Desde jovem, dediquei-me com afinco ao aprendizado, superando inúmeros desafios, sem jamais deixar de aproveitar todas as oportunidades que surgiram. Ao “crescer por meio do desconforto”, alicercei uma sólida carreira internacional, sempre amparada por valores indeléveis, ética, aprendizado contínuo, defendendo a equidade e o respeito profissional e com foco em retribuir ao mundo o que alcancei como profissional. Atualmente, ocupo a posição de vice-presidente sênior na WSP USA, prestigiada multinacional estadunidense do segmento de Consultoria e Engenharia, em que lidero a área de transporte público.
Nasci em Santo André (SP). Sou a filha caçula e a única mulher de uma família de quatro irmãos: Luiz Morais, Carlos Morais e Eduardo Morais. A minha mãe, Tereza de Paiva Morais, já falecida, era dona de casa, e meu pai, Sebastiao de Paiva Morais, trabalhou no setor automobilístico. Diferentemente de meus irmãos, fui a única da família a tentar algo diferente em termos de carreira, me aventurando no exterior. Meus irmãos e meu pai continuam morando no Brasil. Em nossa casa, a educação era um tema importantíssimo. Meus pais nos incentivavam muito para estudar. Eles terminaram somente o ensino básico e sabiam da relevância de concentrar esforços nesse sentido.
No ensino médio, estudei no Colégio Técnico Jorge Street, com o objetivo de me formar como técnica de eletrônica. Foi uma fase muito importante para mim, que contribuiu para minha escolha de cursar Engenharia Elétrica pela FEI, uma instituição extremamente conceituada. Acontece que esse curso exigia um estágio obrigatório e surgiu para mim uma excelente oportunidade, alavancada pelo reconhecimento que a FEI tinha – e ainda tem – junto às empresas. As grandes empresas buscavam jovens talentos na universidade, o que me proporcionou ingressar na Siemens. Essa foi uma das melhores chances que recebi na vida e, assim, logo no início da minha carreira, já estava atuando em uma multinacional prestigiada, o que me abriu as portas para alcançar o sucesso em outros países.
A Siemens propicia a oportunidade de atuar em vários locais, caso haja o desejo genuíno da pessoa. Assim, após começar a jornada no Brasil, assumi precocemente uma posição na Alemanha, em 1999, permanecendo por um ano e meio naquele país. Logo na sequência, em 2001, aceitei a oferta de me mudar para Nova York, com a missão de implementar um projeto de engenharia bastante sofisticado, que apresentou excelentes resultados. Com o êxito do projeto e com o nascimento do meu filho, Reiner Schwarz, decidi que minha vida seria alicerçada nos EUA, principalmente por conta da rápida adaptação.
Quando parti para Nova York, gerenciei o projeto da automação do metrô, algo de grande visibilidade junto à comunidade técnica. Deparei-me em um país novo, inserida em outro contexto cultural, sob enorme pressão, à frente de um projeto de sólido impacto para a sociedade, o que me levou a assimilar aprendizados singulares. Sempre gostei da parte técnica da engenharia e, no início da minha experiência americana, liderei um grupo composto por 50 engenheiros altamente qualificados, como parte de um programa que existia há trinta anos e que jamais havia sido conduzido por uma mulher.
De certa forma, essa empreitada me abriu os olhos. Eles apostaram que eu iria desistir, mas acabei me consolidando no decorrer dos anos, recebendo o respeito de todos, inclusive, tornando-me amiga de muitos deles. Outro evento transformador em minha jornada ocorreu recentemente, ao ser selecionada para liderar o mercado de Transit and Rail, já na WSP USA. O meu time, direto e indireto, é formado por 300 profissionais de alta performance e estamos atuando com o segmento mais robusto da empresa.
A liderança pelo exemplo e a luta pela igualdade no mundo corporativo
Acima de tudo, o mais importante para ser líder ou ocupar qualquer outra posição é amparar-se em valores sólidos, como integridade, ética e transparência, objetivando desenvolver e criar um ambiente de confiança, com comprometimento entre pessoas. Claro que é fundamental que o líder pratique o que fala, dentro do conceito da liderança pelo exemplo. Trabalho em uma área que engloba transportes, lido diretamente com homens e há sim uma forte pressão e é preciso provar-se capaz para obter respeito e credibilidade em relação ao que se fala e o que se executa.
Nós, mulheres, muitas vezes, não acreditamos no nosso potencial, e isso reduz a nossa presença em cargos de alta direção. Segue existindo no mundo corporativo o preconceito inconsciente. A atuação masculina e a feminina têm pesos diferentes, principalmente no meu caso, pois sou uma mulher latina e negra, o que me motiva ainda mais.
Há várias pesquisas que apontam como as mulheres têm se fortalecido no mundo executivo, contribuindo com cerca de 50% da força de trabalho. No entanto, somente 11% delas ocupam cargos de liderança. Essa questão evoluiu nas últimas décadas, mas está longe de ser a ideal.
Equilibrar todos os âmbitos da vida para evitar a estagnação e a autossabotagem
Sobre o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, acredito que o principal ponto é realizar o melhor para a sua família, de acordo com as possibilidades, dentro do tempo de qualidade. Deixei de alcançar algumas realizações porque sentia culpa de que não seria uma boa mãe ou esposa. Contudo, isso não é o ideal. Ao me tornar mãe, muitos projetos de alta visibilidade surgiram, e abdiquei deles para não ficar distante do meu filho.
Por exemplo, me arrependo de não participar do Jack Welch Leadership Program, quando estava na General Eletric, um programa dedicado a empregados de alto desempenho. Desisti de participar, por considerar que afetaria o meu papel em casa. De certa forma, me anulei. Hoje entendo que se deve evitar esse bloqueio psicológico. Nas companhias nas quais trabalhei, a questão da maternidade jamais foi um impeditivo para crescer ou buscar novos desafios. Em Nova York, consegui ficar 12 semanas com o meu filho antes de retomar os meus afazeres. O mundo corporativo está mais bem preparado para aceitar mães trabalhadoras – um conceito que mudou, evoluiu bastante nos últimos tempos.
Priorizar o aprendizado contínuo, com foco em comunicação e relacionamentos
O bom líder é aquele que sabe se comunicar adequadamente – os times precisam saber, com clareza, como o gestor pensa, quais objetivos estão em pauta e quais são os planejamentos. O mercado de trabalho, atualmente, conta com quatro gerações atuando concomitantemente, e é preciso inspirar e empoderar essas equipes com tantas diferenças entre seus integrantes. É um desafio que requer alinhar os propósitos, motivando os indivíduos de formas distintas, entendendo as demandas e os anseios de cada um.
Dedicar-se com a mente aberta, integridade, confiança e comprometimento
Com a mente aberta torna-se mais viável aproveitar as oportunidades que surgem, mesmo aquelas com as quais não se têm tanta afinidade. Na Siemens, por exemplo, passei pelo padrão rotativo, atuando em diversas áreas, como Engenharia, Marketing e Vendas. Sabia do que gostava, mas aprendi muito com os outros nichos.
A visão ampla é fundamental para edificar uma trajetória bem-sucedida, e uso minha experiência como exemplo: não tive medo de ir para a Alemanha, mesmo sem tanta experiência na época, e foi um passo fundamental para sedimentar uma carreira internacional. Soma-se à mente aberta e aos princípios fundamentais para ser uma liderança, iniciativas de se voluntariar para participar de eventos profissionais ou de comunidades profissionais, alinhadas com seu perfil, em prol do desenvolvimento da área. Nos EUA, participo de atividades correlatas ao setor de transportes, compartilhando ideias e atuando ao lado de pessoas que pensam como eu.
Certa vez, recebi um conselho sobre como o crescimento é desconfortável, pois há momentos extremamente desafiadores e difíceis. Porém, tudo está vinculado ao ato de nunca se acomodar, em prol do crescimento. Nessas situações, é importante buscar um equilíbrio e refletir sobre o que realmente nos motiva a prosseguir.
Acreditar em si e contar com o auxílio de mentores e pessoas inspiradoras
Em relação a mentores e inspiradores, posso dizer que minha carreira se divide em três partes. Logo ao me graduar, tive o apoio de Oswaldo Roschel, que me deu todas as oportunidades na empresa – segui suas orientações à risca. Já em Nova York, Jöerg Nuttelmann foi bem colaborativo, capaz de enxergar o potencial de cada pessoa, alocando-a na posição correta, de excelência. Agora, conto com o suporte da Jannet Walker-Ford, que me moldou para a posição executiva. Ela é magnífica e me ajudou a adquirir novos soft skills, para me tornar a executiva que sou hoje.
No geral, todos os programas de liderança que realizei contribuíram para a minha jornada. Porém, um deles, em específico, mudou significativamente a minha trajetória e foi um autêntico investimento de carreira. A indústria já reconhecia minhas capacidades técnicas, sem dúvidas quanto a isso, mas eu precisava evidenciar também outros aspectos da minha personalidade. Recentemente, participei do Leadership APTA Program, um programa desafiador, dedicado ao desenvolvimento da próxima geração de líderes. Indubitavelmente, me ajudou a alcançar a posição que ocupo hoje.
Crescer com o desconforto e criar sua própria versão do sucesso
Algumas pessoas acham que sucesso é só sobre compensação financeira. Discordo disso. Você pode criar sua própria versão de sucesso, um conceito que não é idêntico para todos.
As novas gerações dispõem de diversas oportunidades, prontas para serem aproveitadas. É fundamental empenhar-se, adquirir competências e direcionar esses esforços para o próprio desenvolvimento, ao mesmo tempo em que se colabora com a família e a comunidade. Além disso, há múltiplas alternativas de aprendizado disponíveis fora do contexto acadêmico.
Meu conselho final para quem deseja crescer na carreira é se manter perenemente motivado. Se não tem o desejo de ir trabalhar, por falta de ânimo ou falta de propósito, tome outro rumo. Empenhe-se nas empreitadas com otimismo, alinhado com aquilo que lhe faz feliz, vislumbrando o futuro, todos esses são aspectos motivacionais imprescindíveis. Por fim, reitero a importância de aprender a crescer com o desconforto constante, pois isso evita a falsa sensação de que tudo se resolverá sem esforço ou dedicação, permitindo que você encontre as soluções por conta própria.
Fonte: Exame
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