Depois que os professores explicam uma tarefa, crianças com transtorno de déficit de atenção ou hiperatividade podem ter dificuldade para transformar essas instruções em ação. É um dos vários caminhos pelos quais o TDAH pode prejudicar o desempenho acadêmico de um jovem aluno. “Quando você ouve algo de um professor, você precisa manter a informação em seu cérebro, então processá-la e tomar decisões com base no que ouviu”, disse o neurocientista cognitivo Hadi Hosseini, PhD, da Universidade de Medicina de Stanford.
Essas etapas exigem que os alunos usem sua memória de trabalho, um sistema cerebral que retém informações por curtos períodos de tempo. Quando o sistema não funciona, pode causar frustração tanto para as próprias crianças quanto para professores, pais e outros que estão tentando ajudá-los a aprender tarefas e atividades normais, como terminar uma tarefa ou lembrar de trazer o casaco do parquinho. A equipe de Hosseini estuda uma técnica para ajudar crianças com TDAH a fortalecer sua memória de trabalho. A pesquisa mais recente foi liderada por Hosseini, Ali Rahimpour Jounghani, acadêmico de pós-doutorado em psiquiatria, e Elveda Gozdas, instrutora em psiquiatria e ciências comportamentais.
O trabalho da equipe mostra que uma ferramenta de imagem cerebral portátil e de baixo custo pode fornecer às crianças feedback em tempo real sobre o que seus cérebros estão fazendo durante tarefas cognitivas. As crianças usavam um boné especial na cabeça que envia e recebe luz infravermelha, permitindo que os pesquisadores rastreiem os níveis de oxigênio no sangue em partes específicas do cérebro como um proxy para a atividade cerebral. O grupo de tratamento de 21 crianças que concluíram o programa de 12 semanas foi comparado a 15 crianças em um grupo de controle, que receberam seu tratamento usual para TDAH.
A maioria das crianças com TDAH que concluíram o programa melhoraram sua capacidade de executar tarefas que exigiam memória de trabalho. Cerca de metade delas também tiveram melhorias nos sintomas de TDAH, conforme medido por um questionário padrão. O conceito também é promissor para outras condições neuropsiquiátricas, disse Hosseini, professor associado de psiquiatria e ciências comportamentais na Stanford Medicine, que falou conosco para uma sessão de perguntas e respostas sobre sua pesquisa.
O Estudo
A pesquisa sobre a memória de trabalho em crianças com TDAH surgiu da necessidade de lidar com déficits na função executiva, um processo essencial para tarefas cotidianas como planejamento, tomada de decisão e aprendizado. Esses déficits estão presentes em diversas condições de saúde mental, incluindo autismo, depressão e transtorno obsessivo-compulsivo. A memória de trabalho, um componente fundamental da função executiva, permite reter temporariamente informações para que possam ser utilizadas corretamente. Como os sistemas neurais envolvidos na memória de trabalho são frequentemente comprometidos em crianças com TDAH, o transtorno foi considerado um ponto de partida lógico para a intervenção. Além disso, o TDAH é compreendido atualmente como um problema de regulação da atenção, e a memória de trabalho desempenha um papel crucial nesse processo.
O estudo utilizou neurofeedback, uma técnica que fornece informações em tempo real sobre a atividade cerebral para que os participantes possam tentar controlá-la conscientemente. No início da pesquisa, o cérebro de cada criança foi escaneado para identificar a região do córtex pré-frontal com baixa ativação, uma vez que há grande variação entre indivíduos com TDAH. Com essa abordagem personalizada, cada participante recebeu uma intervenção ajustada às suas necessidades específicas.
Durante as 12 sessões do estudo, as crianças usaram o boné especial equipado com tecnologia de espectroscopia funcional de infravermelho próximo, que permite monitorar a atividade cerebral por meio da luz refletida. Embora essa tecnologia não permita visualizar regiões cerebrais profundas, ela é eficaz para acessar o córtex pré-frontal, onde a memória de trabalho ocorre. Durante cada sessão, os participantes realizavam uma tarefa de memória em que precisavam memorizar uma sequência de letras e, posteriormente, identificar se uma letra alvo fazia parte dessa sequência. O feedback era fornecido por imagens de moedas de ouro na tela do computador, indicando quando a região cerebral-alvo estava sendo ativada com sucesso.
A personalização da intervenção é essencial, pois os transtornos psiquiátricos se manifestam de formas variadas no cérebro. O TDAH é diagnosticado com base em sintomas comportamentais, mas sua biologia subjacente apresenta grande diversidade. Outros tratamentos também incluem elementos personalizados, como a escolha do medicamento mais eficaz para cada paciente, mas a abordagem utilizada no estudo adiciona um diferencial: a capacidade de medir e ajustar a intervenção com base na atividade cerebral em tempo real.
A espectroscopia funcional de infravermelho próximo se destaca por ser uma tecnologia mais acessível e portátil em comparação com a ressonância magnética funcional. Um protótipo de faixa de cabeça com tablet está sendo desenvolvido para permitir que crianças utilizem essa tecnologia em casa, sem a necessidade de acompanhamento constante de um pesquisador ou psiquiatra. Embora os testes ainda não tenham começado com pacientes em ambiente domiciliar, há grande expectativa de que essa solução esteja disponível em breve.
Os medicamentos disponíveis hoje para TDAH atuam de outras maneiras na atenção, mas não diretamente na memória de trabalho. A possibilidade de intervir precocemente e influenciar positivamente o neurodesenvolvimento das crianças representa um grande avanço. Estudos anteriores de neurofeedback para TDAH forneceram informações sobre a atividade cerebral aos pacientes, e pesquisas de treinamento cognitivo tentaram fortalecer habilidades específicas. O diferencial do presente estudo é a integração desses elementos, tornando-se uma promissora alternativa para tratar déficits de função executiva em diferentes condições neurológicas.