A hipoglicemia, o baixo nível de açúcar no sangue, é uma ameaça constante para pacientes com diabetes tipo 1. Níveis de glicose extremamente baixos representam uma situação de risco de vida para a qual o tratamento padrão é a injeção de um hormônio chamado glucagon. Mas um novo implante desenvolvido por engenheiros do MIT promete dispensar as injeções e liberar de forma automática o glucagon.
O estudo foi publicado na revista Nature Biomedical Engineering e Siddharth Krishnan, ex-cientista pesquisador do MIT que agora é professor assistente de engenharia elétrica na Universidade Stanford, assina como principal autor. Como reserva de emergência, para casos em que os pacientes podem não perceber que o nível de açúcar no sangue está caindo a níveis perigosos, os engenheiros do MIT projetaram um reservatório implantável que pode permanecer sob a pele e ser acionado para liberar glucagon quando os níveis de açúcar no sangue ficarem muito baixos. Essa abordagem também pode ajudar em casos em que a hipoglicemia ocorre durante o sono ou em crianças diabéticas que não conseguem administrar injeções sozinhas.
“Este é um pequeno dispositivo para emergências que pode ser colocado sob a pele, onde está pronto para agir caso o nível de açúcar no sangue do paciente caia muito”, explica Daniel Anderson, professor do Departamento de Engenharia Química do MIT, membro do Instituto Koch para Pesquisa Integrativa do Câncer e do Instituto de Engenharia Médica e Ciência (IMES) do MIT, e autor sênior do estudo. “Nosso objetivo era construir um dispositivo que esteja sempre pronto para proteger os pacientes da hipoglicemia. Acreditamos que isso também pode ajudar a aliviar o medo de hipoglicemia que muitos pacientes e seus pais sofrem.” Os pesquisadores mostraram que este dispositivo também pode ser usado para administrar doses emergenciais de epinefrina, um medicamento usado para tratar ataques cardíacos e que também pode prevenir reações alérgicas graves, incluindo choque anafilático.
Resposta de emergência
A maioria dos pacientes com diabetes tipo 1 usa injeções diárias de insulina para ajudar o corpo a absorver o açúcar e evitar que os níveis de açúcar no sangue fiquem muito altos. No entanto, se os níveis de açúca r no sangue caírem muito, eles desenvolvem hipoglicemia, o que pode levar a confusão e convulsões, e pode ser fatal se não for tratado. Para combater a hipoglicemia, alguns pacientes carregam seringas pré-carregadas de glucagon, um hormônio que estimula o fígado a liberar glicose na corrente sanguínea. No entanto, nem sempre é fácil para as pessoas, especialmente crianças, saberem quando estão se tornando hipoglicêmicas.
Anderson lembra que “alguns pacientes conseguem sentir quando estão com hipoglicemia e vão comer alguma coisa ou se automedicar com glucagon”, mas alerta para o fato de que “alguns não sabem que estão hipoglicêmicos e podem simplesmente entrar em confusão e coma. Isso também é um problema quando os pacientes dormem, pois dependem dos alarmes dos sensores de glicose para acordá-los quando o nível de açúcar cai perigosamente.” Para facilitar o combate à hipoglicemia, a equipe do MIT decidiu projetar um dispositivo de emergência que pudesse ser acionado pela pessoa que o utilizasse ou automaticamente por um sensor. O dispositivo, que tem aproximadamente o tamanho de uma moeda de 25 centavos, contém um pequeno reservatório de medicamento feito de um polímero impresso em 3D. O reservatório é selado com um material especial conhecido como liga com memória de forma, que pode ser programado para mudar de forma quando aquecido. Neste caso, o pesquisador utilizou uma liga de níquel-titânio programada para se curvar de uma placa plana para um formato de U quando aquecida a 40 graus Celsius.
Como muitos outros medicamentos proteicos ou peptídicos, o glucagon tende a se decompor rapidamente, de modo que a forma líquida não pode ser armazenada por muito tempo no corpo. Em vez disso, a equipe do MIT criou uma versão em pó do medicamento, que permanece estável por muito mais tempo e permanece no reservatório até ser liberada. Cada dispositivo pode transportar uma ou quatro doses de glucagon e também inclui uma antena sintonizada para responder a uma frequência específica na faixa de radiofrequência. Isso permite que ele seja acionado remotamente para gerar uma pequena corrente elétrica, que é usada para aquecer a liga com memória de forma. Quando a temperatura atinge o limite de 40 graus, a placa se curva em forma de U, liberando o conteúdo do reservatório.
Como o dispositivo pode receber sinais sem fio, ele também pode ser projetado para que a liberação do medicamento seja acionada por um monitor de glicose quando o nível de açúcar no sangue do usuário cair abaixo de um determinado nível. “Uma das principais características desse tipo de sistema digital de administração de medicamentos é que ele pode se comunicar com sensores”, afirma Krishnan. “Nesse caso, a tecnologia de monitoramento contínuo de glicose, que muitos pacientes usam, seria fácil para esses tipos de dispositivos interagirem.”
Revertendo a hipoglicemia
Após implantar o dispositivo em camundongos diabéticos, os pesquisadores o utilizaram para desencadear a liberação de glucagon à medida que os níveis de açúcar no sangue dos animais caíam. Em menos de 10 minutos após a ativação da liberação do medicamento, os níveis de açúcar no sangue começaram a se estabilizar, permitindo que permanecessem dentro da faixa normal e evitando a hipoglicemia. Os pesquisadores também testaram o dispositivo com uma versão em pó de epinefrina. Descobriram que, 10 minutos após a liberação do medicamento, os níveis de epinefrina na corrente sanguínea aumentaram e a frequência cardíaca também.
Neste estudo, os pesquisadores mantiveram os dispositivos implantados por até quatro semanas, mas agora planejam ver se conseguem estender esse tempo para pelo menos um ano. “A ideia é que teríamos doses suficientes para proporcionar esse evento terapêutico de resgate por um período significativo. Não sabemos exatamente quanto tempo isso significa — talvez um ano, talvez alguns anos, e atualmente estamos trabalhando para estabelecer qual é o tempo de vida ideal. Mas, depois disso, seria necessário substituí-lo”, diz Krishnan.
Normalmente, quando um dispositivo médico é implantado no corpo, desenvolve-se tecido cicatricial ao redor do dispositivo, o que pode interferir em seu funcionamento. No entanto, neste estudo, os pesquisadores demonstraram que, mesmo após a formação de tecido fibrótico ao redor do implante, eles conseguiram desencadear com sucesso a liberação do medicamento. Os pesquisadores agora estão planejando estudos adicionais com animais e esperam começar a testar o dispositivo em ensaios clínicos dentro dos próximos três anos. “É realmente emocionante ver nossa equipe realizar isso, o que espero que um dia ajude pacientes diabéticos e possa fornecer um novo paradigma para a administração de qualquer medicamento de emergência”, conclui Robert Langer, professor do Instituto David H. Koch no MIT e também autor do artigo.