Uma em cada 3.000 pessoas pode ser portadora de um gene defeituoso que aumenta significativamente o risco de se ter um pulmão perfurado, de acordo com novas estimativas da Universidade de Cambridge. Estudos anteriores colocavam esse risco mais próximo de uma em 200.000 pessoas. Mas os pesquisadores acabam de descobrir que o risco é quase 100 vezes maior do que a estimativa apresentada inicialmente.
O gene em questão, FLCN, está ligado a uma condição conhecida como síndrome de Birt-Hogg-Dubé que tem como sintomas tumores benignos de pele, cistos pulmonares e um risco aumentado de câncer de rim. No estudo publicado hoje (08.04) no periódico Thorax, uma equipe da Universidade de Cambridge examinou dados do UK Biobank, do 100.000 Genomes Project e do East London Genes & Health — três grandes conjuntos de dados genômicos abrangendo mais de 550.000 pessoas.
Eles descobriram que um em 2.710 e um em 4.190 indivíduos carrega a variante particular de FLCN que está por trás da síndrome de Birt-Hogg-Dubé. Por isso, o professor Stefan Marciniak, pesquisador da Universidade e consultor honorário no Cambridge University Hospitals NHS Foundation Trust e no Royal Papworth Hospital NHS Foundation Trust, alerta: “Se um indivíduo tem a síndrome de Birt-Hogg-Dubé, é muito importante que possamos diagnosticá-la, porque ele e seus familiares também podem estar em risco de câncer renal”.
Pulmão perfurado – conhecido como pneumotórax – é causado por um vazamento de ar no pulmão, resultando em desinsuflação pulmonar dolorosa e falta de ar. No entanto, nem todo caso de pulmão perfurado é causado por uma falha no gene FLCN. Cerca de um em cada 200 homens altos e magros na adolescência ou no início dos vinte anos sofrerá um pulmão perfurado e, para muitos deles, a condição se resolverá sozinha, ou os médicos removerão o ar ou fluido de seus pulmões enquanto tratam o indivíduo como paciente ambulatorial; muitos nem saberão que têm a condição.
Se um indivíduo tiver um pulmão perfurado e não se encaixar nas características comuns – por exemplo, se estiver na faixa dos quarenta – os médicos procurarão por cistos reveladores nos pulmões inferiores, visíveis em uma ressonância magnética. Se estiverem presentes, é provável que o indivíduo tenha a síndrome de Birt-Hogg-Dubé.
O professor Marciniak colidera a primeira Rede Colaborativa de Doenças Raras de Pneumotórax Familiar do Reino Unido, juntamente com o professor Kevin Blyth no Queen Elizabeth University Hospital e na Universidade de Glasgow. O objetivo da Rede é otimizar o cuidado e o tratamento de pacientes com formas raras e hereditárias de pneumotórax familiar e dar suporte à pesquisa sobre essa condição.
“A boa notícia é que o pulmão perfurado geralmente acontece de 10 a 20 anos antes de o indivíduo apresentar sintomas de câncer renal, então podemos ficar de olho neles, fazer exames todos os anos e, se virmos o tumor, ainda deve ser cedo o suficiente para curá-lo”, dia o professor. Marciniak conta ainda que ficou surpreso ao descobrir que o risco de câncer renal era muito menor em portadores do gene FLCN defeituoso que não foram diagnosticados com a síndrome de Birt-Hogg-Dubé.“Embora sempre tenhamos pensado na síndrome de Birt-Hogg-Dubé como sendo causada por um único gene defeituoso, há claramente algo mais acontecendo”, ele explica. “Os pacientes de Birt-Hogg-Dubé que temos cuidado e estudado nas últimas duas décadas não são representativos de quando esse gene está quebrado na população em geral. Deve haver algo mais sobre seu histórico genético que está interagindo com o gene para causar os sintomas adicionais.”
A descoberta levanta a questão de se, se um indivíduo for descoberto com um gene FLCN defeituoso, ele deve ser submetido a um exame para câncer renal. No entanto, o professor Marciniak não acredita que isso será necessário. “Com o uso crescente de testes genéticos, sem dúvida encontraremos mais pessoas com essas mutações”, disse ele, “mas, a menos que vejamos outros sinais reveladores da síndrome de Birt-Hogg-Dubé, nosso estudo mostra que não há razão para acreditar que elas terão o mesmo risco elevado de câncer”.
A pesquisa foi financiada pelo Myrovlytis Trust, uma organização beneficente sediada no Reino Unido dedicada à pesquisa de doenças raras e ao engajamento público em genética médica e molecular, com apoio adicional do Instituto Nacional de Pesquisa em Saúde e Cuidados do Centro de Pesquisa Biomédica de Cambridge. “Há muito tempo acreditamos que a prevalência da síndrome de Birt-Hogg-Dubé é muito maior do que o relatado anteriormente. Isso destaca a importância do teste genético para qualquer pessoa que tenha algum dos principais sintomas associados à BHD, incluindo um pulmão colapsado. E ainda mais a importância do mundo médico estar ciente dessa condição para qualquer pessoa que se apresente em um departamento de emergência ou clínica com esses sintomas. Estamos ansiosos para ver o impacto que o resultado deste projeto tem na comunidade de Birt-Hogg-Dubé e em geral”, conclui Katie Honeywood, CEO do Myrovlytis Trust.